Maggi quer ferrovia paralela à BR 163 e diz que há grupos interessados em participar do projeto
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Quarta, 19 Março 2014
| RODRIGO VARGAS/GLOBO RURAL
Em entrevista exclusiva ao repórter Rodrigo Vargas, o ex-governador de Mato Grosso e atual senador Blairo Maggi detalhou os projetos de infraestrutura que o seu grupo empresarial e mais três multinacionais do agronegócio levaram ao Ministério dos Transportes nesta terça-feira, dia 18 de março. O grupo propõe, entre outras medidas, a construção de uma ferrovia ligando Sinop (MT) a Miritituba (PA), e dispõe-se a participar financeiramente do projeto. Leia a íntegra da entrevista, ilustrada por um desenho de próprio punho do senador Maggi.
GLOBO RURAL – Neste ano, uma parte considerável da safra de Mato Grosso seguirá novamente em direção ao Sul. Quando o senhor acredita que esta situação irá mudar de fato?
BLAIRO MAGGI - Esse cenário vai mudar definitivamente em 2016. Nós teremos a BR-163 funcionando em sua plenitude, e não apenas ela. Teremos também os terminais em Miritituba, Santarém, Belém e Macapá, que serão construídos por várias empresas. Todos eles deverão estar prontos para a safra 2016.
GLOBO RURAL – Qual será o resultado imediato deste novo cenário?
MAGGI - A pressão sobre a ALL ou sobre as rodovias de Rondonópolis em direção ao Sul vai ser muito diminuída. A estimativa é que, nesta fase inicial, nós já estaremos escoando mais de 10 milhões de toneladas pelos projetos do Norte. Agora, é preciso lembrar uma realidade: a cada ano a safra aumenta em Mato Grosso, com novas áreas e ganhos de produtividade. Então teremos uma folga em 2016, mas os programas de ampliação terão de continuar, senão em pouco tempo estaremos em um novo gargalo.
GLOBO RURAL – Ou seja, o gargalo poderá apenas mudar de direção?
MAGGI - No início, aquelas 10 milhões de toneladas para o Norte estarão dentro das expectativas e não serão um gargalo. A partir daí, não será possível se acomodar. A ALL, por exemplo, tem que fazer reforma nas suas vias, ser mais eficiente e baixar o preço, que está muito caro, praticamente o preço do frete por caminhão. E quem vai forçar ela a fazer isso vai ser a saída para o Norte. A diminuição de mercadoria em Rondonópolis vai fazer com que os preços de frete por ali tendam a cair e, consequentemente, melhorar a remuneração dos produtores em todo o Estado.
GLOBO RURAL – A ALL diz que seus preços são compatíveis com os custos do mercado.
MAGGI - Mundialmente se aceita o preço de transporte ferroviário competitivo a US$ 30 por tonelada a cada mil quilômetros. Aqui, o preço da Ferronorte deve estar entre US$ 70 a US$ 80. Então há muito que melhorar e se virar em busca da competitividade.
GLOBO RURAL – Com a ampliação das estruturas de escoamento no Norte, ainda haverá demanda para a rota anterior?
MAGGI – Com toda a certeza. O caminho natural da soja produzida no Sul de Mato Grosso, por exemplo, não é em direção ao Norte. Nós não vamos pegar soja daquela região e levar para Santarém. Então a ferrovia e o Porto de Santos sempre terão o seu papel. Quando eu digo que o Norte vai levar à queda nos preços é porque essa oferta de mercadoria que existe hoje não será mais a mesma no futuro. Eles terão que ser mais competitivos e baixar os preços. Tem uma gordura aí que precisa ser dividida.
GLOBO RURAL – Já houve muitas promessas descumpridas em relação à conclusão do asfaltamento da BR-163. Por que acreditar que agora será diferente?
MAGGI - Agora é diferente porque faltam apenas 170 quilômetros a serem asfaltados. E esse investimento entrou na agenda do governo e na agenda das empresas. Eu estou lá, já fiz embarcações, empurradores, barcaças e estamos construindo um terminal. A Bunge está construindo um terminal novo. A Cargill já está em Santarém, além de outras empresas que já anunciaram investimentos na BR. Este ano, nós mesmos estamos tirando soja por lá. A Maggi, Bunge e a Cargill estão tirando soja por lá. Nós estamos enfrentando estes 170 quilômetros de estrada de chão. Está demorando sete dias para levar uma carga e cinco dias para voltar. Mas estamos fazendo porque não temos dúvidas de que esta rodovia vai ficar pronta.
GLOBO RURAL – Esse escoamento tem alguma lógica financeira ou se trata, nas atuais condições, de um ato simbólico, para marcar posição?
MAGGI – Neste momento, o mesmo preço que a gente paga para sair de caminhão rumo ao Sul, mais o frete do trem, nós estamos pagando para ir para o Norte. Ou seja, neste momento não tem ganho nenhum. Mas a gente sabe que tem de experimentar, tem de criar o corredor, testar os equipamentos. É um enfrentamento que tem de ser feito. No momento em que ficarem prontos os 170 quilômetros, este custo deve ser reduzido em US$ 20 por tonelada, no mínimo.
GLOBO RURAL – Nesta safra, quanto já foi escoado desta forma?
MAGGI - Já devem ter embarcado umas 60 mil toneladas de soja só neste ano. E deve estar para embarcar o primeiro navio lá em Barcarena.
GLOBO RURAL – Como a sua empresa atua na região?
MAGGI - A Maggi e a Bunge montaram uma empresa de navegação nos moldes da que eu tenho lá em Itacoatiara [AM]. A Bunge fez os terminais dela em Miritituba e em Barcarena. Estão prontos. E a Maggi está embarcando pelos terminais deles. A Bunge fazendo o serviço deles e nós o nosso.
GLOBO RURAL – Além das rodovias, muito tem se falado sobre a ampliação das alternativas para o modal ferroviário. O que o senhor considera prioritário?
MAGGI - Hoje mesmo estivemos no Ministério dos Transportes propondo o lançamento de um projeto para fazer uma ferrovia desde Sinop até Miritituba. As grandes empresas do setor estão trabalhando nesta ideia de um Memorando de Intenção de Investimento. O governo deve lançar este projeto e serão feitos estudos de implantação desta ferrovia, paralela à BR-163, que vejo como a grande alternativa para Mato Grosso. Nós contratamos uma empresa que realizou estudos que mostram ser muito clara a competitividade desta linha, que sai da região produtora de grãos, chega à hidrovia e, de lá, vai para o navio. É algo muito competitivo.
GLOBO RURAL – O investimento seria privado ou estatal?
MAGGI - Seria neste modelo que o Governo Federal está propondo hoje. O Estado financiar este pacote de investimento, depois ter outro operador independente. E tem empresas ávidas por este investimento. Hoje, em todas as ferrovias brasileiras, é preciso passar por malhas já existentes, tem que ter direito de passagem e se cria uma confusão. Uma ferrovia destas, que pelas nossas contas poderia transportar até 30 milhões de toneladas até 2020, seria uma via expressa, com um trem que fará uma ida e volta em quatro dias. Ou seja, muito rápida, competitiva e sem as interferências que as outras ferrovias tem hoje. Custaria uns R$ 6 bilhões.
GLOBO RURAL – Alguma relação com o anunciado interesse chinês na implantação desta mesma rota?
MAGGI - Não. Os chineses olharam, e acho que estão em busca de um bom negócio, mas até agora ninguém assinou um memorando de intenções. E essas empresas do Brasil, Bunge, Cargill, Maggi e Dreyfus, estão discutindo seriamente esta proposta. Não é que nós iremos fazer, porque isso iria para leilão. O que estamos dizendo ao governo é o seguinte: pode colocar que haverá interessados. Se for A ou B ou C que irá fazer, não interessa. O que interessa é que seja feito.
GLOBO RURAL – Como tem funcionado essa articulação conjunta das trades?
MAGGI - Nós estamos há um ano estudando todos estes projetos e temos um modelo muito claro das alternativas. Não é só essa a proposta que está sendo feita. Estamos fazendo outra proposição de que a FICO (Ferrovia de Integração do Centro-Oeste), em vez de ir a Lucas do Rio Verde, fique só na região do Araguaia, indo de Água Boa em direção à Norte-Sul. E indicamos outra ferrovia, vinda de Porto Velho até Sapezal. Seriam três ramais de ferrovias indo em direção aos rios do Norte. Em vez de termos uma linha vindo Leste-Oeste, teríamos três subindo, mais a ALL embaixo. Mato Grosso sairia por quatro ferrovias, em direção a dois rios amazônicos, São Luiz do Maranhão e Santos.
GLOBO RURAL – Considerando um cenário ideal, no qual todos estes investimentos se concretizem, como analisa o futuro de Mato Grosso?
MAGGI - Nós estamos prevendo que Mato Grosso estará exportando 70 milhões de toneladas de soja até 2020. Isso significa que não é uma hidrovia, uma ferrovia, uma rodovia que vai resolver a questão do escoamento. É preciso várias opções e este projeto que estamos trabalhando atende as quatro pontas do Estado com diferentes saídas. E para fazer esta produção prevista, se não tiver essas alternativas será muito difícil atingir estes objetivos.
GLOBO RURAL – Há interesse do Governo Federal na construção deste modelo?
MAGGI – Eu vejo que o governo está muito interessado. Agora, é fundamental que os programas sejam desenvolvidos da forma como estamos fazendo agora, ou seja, levando a demanda ao governo e dizendo: nestes projetos A, B, C ou D tem interessados A, B, C ou D. É muito mais fácil. Há uma decisão do governo em fazer e se houver, do outro lado, empresas que possam liderar estes investimentos, eu não tenho dúvida alguma de que faremos isso muito rápido. Isso não significa que quem está à frente, provocando, seja o tomador, o investidor do processo. Eu penso até que virão outros investidores, uma vez que a carga estará disponível. Ora, se você tem carga, você tem quem vau pagar a conta. É uma questão de administração e de planejamento.